miércoles, 30 de diciembre de 2009

Carta para mim


Querida Quel,


Pois não me surpreende nada saber que você está doente. Gripe no inverno é bem você. Todo mundo que te conhece sabe que seu corpo não foi projetado para baixas temperaturas e se for acompanho de dias chuvosos, então piorou. E eu sei de um detalhe extra para você se sentir assim, borocoxo: sua família esta reunida no Brasil, num momento inédito. Primeiro fim de ano de seus pais e sua irmã, junto ao seu irmão, sua cunhada e sua sobrinha chinesa. Sei, sei... que não são só eles, tem sua afilhada, tem amigos, tem sua vó, suas tias, seus primos... Fica tranqüila que ano que vem você estará com eles.
Mas também tem outra coisa, esse mal estar que você está sentido, é a última queixa do seu corpo e da sua mente a este 2009, que foi tão difícil. Pode ter certeza que virando o ano, se o dia amanhecer ensolarado (detalhe bem importante), você vai ser estar novinha em folha, com corpo, mente e alma renovados. Afinal isso é o que todos desejamos para um ano que se inicia. Eu desejo isso e muito mais a você!
Você está vivendo um momento delicado de sua vida, tendo que se acostumar com a idéia que terá que deixar muitas coisas para trás, afinal são mais de 6 anos em Barcelona. Sei que é difícil até de alguém entender como pode ser prazeroso e sofrido deixar Barcelona. Prazeroso, porque você volta para o SEU país, para uma boa oportunidade na sua carreira profissional e para mais perto da família e dos amigos queridos, deixará de se sentir como uma emigrante sem oportunidade, numa Espanha em crise. A vida de "subemprego" já é coisa do passado.
Sei também, que apesar de todas as dificuldades que passou, você ama essa cidade!!! Nela descobriu tantas coisas, viveu tantas experiências distintas, conheceu tanta gente bacana do mundo inteiro, ampliou sua cultura, amadureceu, endureceu, amoleu... cresceu e se multiplicou.
E o conflito não é só deixar para trás e começar vida nova. É não saber onde essa nova vida será. Que será dentro de você, isso é certo!
Mas em que estado? Em que cidade? Quem será seus novos amigos? Conseguirá manter com o mesmo calor as amizades distantes? Estará sozinha ou acompanhada? Como será sua nova casa? E que trabalho realmente terás?
São perguntas que você ainda não tem como saber. E claro, qualquer um pode entender que é muito angustiante.
Enquanto isso, eu te conheço, você segue em frente... por um lado arrematando o fechamento do ciclo, pois ainda está em Barcelona e cada dia resolvendo um probleminha novo (como pode ser tão burocrático e lento a legalização de alguns documentos?), ou aposto que você usa seu tempo escolhendo o que quer levar para sua nova vida e o que deve abrir mão. Desapego nunca foi seu forte, mas tente ver como uma ótima oportunidade para trabalhar uma lição importante a ser aprendida. Dizem que só quando nos desfazemos das coisas que não usamos, criamos espaços para surgirem as coisas que tem importância.
Entretanto, eu também sei que tem um lado seu que está planejando o futuro, que vai abrindo caminhos, para que diversas possibilidades se manifestem e por fim, você saiba onde te destina viver em 2010 e que vida terá.
Como sua mãe sempre diz , as coisas para você nunca são fáceis, nunca vem de “mão beijada”, por falar nisso de onde surgiu essa expressão? Vou perguntar para ela qualquer dia desses. Por isso, não esquece que você é uma batalhadora, uma guerreira, e 2009 você pode terminar muita satisfeita e contente, pois você saiu vencedora.
E sinceramente, acho que não será diferente em 2010. É acreditar e agir. Estar atenta e serena. Ser feliz e ser tudo que você sempre quis.

Ah! Reparei que você mudou o banner do ComuniQuel, ficou a sua “cara”. Ou melhor, com a sua cara, com seu umbigo, com Magritte, com Dali e outras miscelânias mais. Chicabacana, é bom que o ComuniQuel já anuncie mudanças, porque a Quel muitas mudanças mais terá para postar aqui durante todo 2010.

Besitossss

Quel

Obs1: A Silmara do blog “A menina da flauta” escreveu uma ótima carta para ela mesma. Gostei da idéia e estou fazendo o mesmo. E iria adorar ler mais cartas destinadas ao próprio remetente, nos blogs dos amigos.


Feliz 2010 a todos que passarem por aqui!!!!!

sábado, 19 de diciembre de 2009

Natal humano


Este ano quero dizer que o Natal me faz lembrar o quanto é importante ter fé no ser humano.
Este ano descobri uma fé imensurável em mim, para conseguir ultrapassar todos os problemas para finalizar a Tese Doutoral, e apresentá-la com todo rigor e confiança que era necessário.
Este ano mantive a fé em meus pais, que eles estariam comigo, para o que desse e viesse, como na verdade, eles têm feito desde que eu e meus irmãos existimos.
Este ano vacilei e me fortifiquei na fé que meu companheiro iria ter paciência e tolerância com esse período tão complicado e estressante que eu vivi, e que passado a tormenta seguiríamos juntos e melhor.
Este ano tive fé que meus amigos, irmãos e familiares seriam compreensivos com minhas ausências e seguiriam me apoiando e me querendo apesar de qualquer problema, tempo ou distância.
Este ano senti fé pelo poder no amor pelos animais (que por não serem humanos não deveriam estar nesta lista), mas justamente por serem criaturas da natureza como nós, nos faz sentir conectados a eles e com nós mesmo. Este ano quase perdi meu gato Dali, mas com fé recuperei um companheiro que me faz sentir serena, lúdica e amada.
Este ano percebi com fé como novas pessoas entraram em minha vida e fizeram a diferença.
Em 2009 aprendi não só a fortificar minha fé no humano, para aceitar pessoas e atitudes que pareciam atrapalhar meus planos, ou que não me beneficiavam em nenhum aspecto, para desenvolver a fé no tempo.
Fé em aceitar que temos que fazer a nossa parte, da melhor maneira possível, mas que a resposta, conseqüência, reação, resultado, seja lá o nome que tenha o que nos faz ficar ansiosos, tem seu tempo para acontecer.
E é preciso respeitar esse tempo.
Respeitar que as pessoas não são como queremos que elas sejam, que elas não reagem como gostaríamos, e que o tempo tem seu ritmo próprio para fazer ocorrer.
Quando tenho mais fé em mim, no próximo e no tempo, inevitavelmente tenho mais fé em Deus. Que está dentro de todo aquele que deseje.
Que neste Natal e em 2010, o nosso lado divino encha de luz nosso lado mais humano. E assim possamos ser felizes, abençoados, solidários, agradecidos e renovar nossos sonhos.

Obrigada!

viernes, 11 de diciembre de 2009

Quando eu era...

Ontem assisti um peça de teatro que me fez pensar em quem eu fui.
Petita feina per a pallasso vell conta a história de três palhaços que se encontram por responderem a um anuncio de trabalho solicitando um palhaço velho.
Juntos, na sala de espera, recordam os tempos que foram os reis do circo. Entretanto, a ansiedade por demonstrar sua superioridade para conseguir o que pode ser o último trabalho de suas vidas faz surgir a lado escuro de cada um, o conflito e a incoerência que habita em todo ser humano.
Por que lhes conto isso? Porque já fui palhaça.
Quando trabalhava como atriz tinha uma predileção pelo drama, mas sabia que um bom ator era aquele capaz de emocionar nas situações mais diversas. E lá fui eu me matricular em uma escola de clown. No começo lembro que foi difícil me despojar e me permitir ser uma nova eu. Pois é assim que se sente quando se descobre o palhaço que se leva dentro. É preciso nenhuma autocrítica e muito ridículo para rir de si mesmo, e poder fazer o outro rir da gague mais tonta.
Mas quando se descobre essa vertente, o mundo se amplia.
O meu mundo se expandiu. Descobri algo em mim que desconhecia e detalhes que estavam ali, mas eu fazia que não via. Foi preciso exacerbar as emoções, as caras, bocas e coração, e depois achar o tom certo. Quando se descobre o palhaço pessoal, o ser se torna mais completo e mais que tudo: há uma grande sensação de liberdade.
Gostei tanto de ser palhaça que levo na bagagem bons espetáculos em ruas, parques, festas infantis, circo e teatro.
E voltando ao teatro...
O espetáculo começou com momentos cômicos sutis, e na mágica hora que cada personagem se vestiu de palhaço e fez os números de circo, a platéia do íntimo auditório se multiplicou em risos que se emendavam em mais risos.
Por um momento não sabia se olhava o palco ou a platéia se deleitando com o espetáculo.
Que sensação boa rir e estar com gente rindo.
Sim, sei bem que tem muito palhaço sem graça por ai. Sempre gostei de circo, mas me lembro de algumas vezes que fui e a pior parte era quando entrava os palhaços. Também tive o prazer de ver a espetáculos que realmente o palhaço era a alegria do circo e o número mais esperado, em que não importa a idade que tenha ou o momento de sua vida, você ri e se sente criança.
E que sensação boa é se sentir criança quando se é adulto.
Sai do espetáculo de alma lavada, e ao mesmo tempo pensativa como só uma boa obra nos faz sentir.
Fiquei pensando no excelente texto (e absurdo!) do dramaturgo romano Matei Visniec, nos fantásticos palhaços Jordi Martínez (Filippo), Monti (Nicollo) y Claret Clown (Peppino), no respeito e admiração aos que se entregam a esse oficio e fiquei pensando se eu ainda era uma palhaça...

jueves, 3 de diciembre de 2009

Ressaca “cum laude”!

Foto: Manel Lopez diretor da Tese
José Manuel Perez Tornero presidente do tribunal
Raquel Gomes de Oliveira a mais nova doutora!
Josep Lluis Mico doutor y professor da Universidad Ramon Llull de Barcelona
Andreu Casero Ripollés doutor y professor da Universidad Jaume I de Castellón

Um dia antes, do tão esperado dia, me deu um “bajon”, como se diz aqui na Espanha. Fiquei borocoxo mesmo. Senti meu corpo dolorido, minha cabeça pesada, meu intestino acelerado, como estava tudo preparado me permiti ficar de “molho” e viver um dia de economizar energias. Sabia que no dia seguinte teria que ser forte, então me recolhi.
Antes de deitar, olhei o céu, como muitas noites faço, e uma lua cheia, brilhante me fez sentir mais tranquila. Dormi muito, para minha surpresa. Pensei que a última noite antes do grande dia seria de insônia, ou pelo menos mal dormida, como várias noites anteriores. Mas não. Dormi 10 horas seguidas de um sono reparador. E no dia D (de doutora mesmo) estava a mil. Um sol lindo me dava a energia que tanto necessitava. As horas passaram como minutos e logo chegou o grande momento.
Como sabia que era o espetáculo mais importante da minha vida, cuidei com carinho do figurino, da maquiagem e do penteado. Repassei o texto uma vez mais.
Na hora da atuação sou surpreendida que não teria 40 minutos para apresentar a tese, como é de costume, e sim 25 minutos. Com tal notícia começo a encenação, um pouco nervosa tenho que assumir, porém pouco a pouco a confiança vai tomando conta do meu ser e consigo sintetizar mais de 600 páginas de trabalho no tempo estabelecido. Ponto para mim!
Só que a grande prova ainda estava por vir. Os membros do tribunal fariam suas críticas e perguntas e eu teria todo o tempo que quisesse para a réplica. Fui anotando os vários pontos comentados por eles e os questionamentos que me lançavam. Depois, foi organizar o pensamento para conseguir ser mais clara o possível e mostrar que dominava o assunto.
Depois da minha réplica ainda tiveram novas perguntas e lá fui eu respirar fundo e encontrar forças para seguir explicando. Chegou um momento em que queria que tudo aquilo acabasse de uma vez. Sentia minha boca seca e as palavras em espanhol começaram a sumir do meu vocabulário.
Parecia que se davam por satisfeitos, falaram que foi um trabalho "titânico", que havia muitas teses dentro daquela tese, que a investigação despertava muitos questionamentos e discussão, o que era positivo, e que eu demonstrava que sabia muito mais do que havia escrito. Entretanto eu não estava satisfeita. Sabia que poderia seguir defendendo, e realmente é esta palavra, DEFENDENDO meu trabalho. Mas também sentia que minhas forças se estavam esgotando. Dei por encerrada minhas reflexões e eles também.
Era o momento da deliberação. Ficamos esperando do lado de fora, enquanto os membros do tribunal chegavam num acordo de como deveriam me qualificar. O tempo demorou a passar e finalmente nos chamaram novamente a sala, para dar o veredicto.
Todos de pé para o grande anuncio: “Doutora qualificada com excelente cum laude” . Escutei os aplausos e apesar de ter um sorriso imenso no rosto ainda não assimilava o que aquela frase queria dizer. O tempo parou, por alguns segundos não sabia como reagir. Fui então cumprimentar meu companheiro Matheus, que começou a chorar. Abracei meu diretor de tese, Manuel, que estava emocionadíssimo. Depois os membros do jurado e os amigos. Realmente foi uma emoção muito forte, ver meu esforço de tantos anos reconhecido. E não contive as lágrimas de alegria.
Sinceramente não esperava esta qualificação. Estava tranquila que tinha dado meu melhor, mas também sabia que havia pontos que necessitavam de aperfeiçoamentos... Obviamente a desejava, mas fui avisada de como estavam sendo rígidos para dar a nota máxima a uma tese de doutorado. Fiquei radiante, agradeci em pensamento a Deus, ao Espírito Santo, aos anjos e a Nossa Senhora, aos meus pais e a todos os demais, que sei que estiveram de longe rezando e torcendo por mim.
Ligar para minha casa no Brasil e contar a notícia aos meus pais foi outra grande emoção, ver a felicidade deles, faz valer a pena qualquer esforço.
Depois, proporcionei um jantar brasileiro, com direito a feijoada, picanha e caipirinha para aqueles que tinham me julgado. Foi realmente um jantar delicioso. Voltei como Doutora ao restaurante que havia trabalhado mais de um ano como “chica de la caipiriña” e fui recebida com muito carinho pelos colegas que continuavam trabalhando ali.
Voltei para casa zonza... de felicidade, de caipirinha, de cansaço. Hoje o dia está estranho. Um ciclo importantíssimo em minha vida se fechou. Estou curtindo um dia introspectivo, mas não de “bajon”, é de ressaca mesmo. Ressaca pela noite celebrada, pela tarde duramente vivida e pelos 6 anos de inacreditáveis experiências em uma terra estrangeira.
É ressaca, só que “cum laude”!

Obrigada a todos que me apoiaram durante todos esses anos!
Besitosss
Quel